Durante a Cúpula de Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 2015, foi aprovada, por 193 Estados-membros, a Agenda 2030, que definiu os objetivos para o mundo erradicar a pobreza, respeitando o meio ambiente. O plano de ação da Agenda 2030 é formado por 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e 169 metas, que indicam as trajetórias e as políticas a serem seguidas para o cumprimento dos objetivos. No contexto da Agenda, da qual o Brasil participa, o Ipea publicou o relatório “ODS 7 – Assegurar o acesso confiável, sustentável, moderno e a preço acessível à energia para todos”, um dos 17 objetivos. O relatório apresenta um diagnóstico inicial da posição do do Brasil na utilização de fontes de energia limpas, avalia as atuais políticas públicas de estímulo ao uso mais intensivo de energias renováveis e analisa as tarifas de energia elétrica pagas pelos consumidores.
Os dados e informações levantados no relatório confirmam que avanços importantes vêm sendo obtidos pelo país no aumento da utilização das fontes renováveis (eólica, biomassa, solar, hidráulicas) na geração de energia elétrica. A participação das renováveis aumentou de um patamar já elevado, de 78,7%, no final de 2013, para 83,0%, em dezembro de 2018. Quando se compara com a situação mundial, a posição do Brasil como país modelo em energias limpas é realçada: a capacidade instalada das energias renováveis no mundo permite produzir apenas 26,5% da energia elétrica consumida, segundo dados da International Renewable Energy Agency – Irena, não obstante o substancial aumento dos investimentos em energias eólica e solar nos anos recentes. Assim, 73,5% da energia elétrica mundial ainda dependem de fontes não renováveis, como o petróleo, o carvão e as usinas nucleares.
Dentre as fontes renováveis, a presença maior no Brasil é das usinas hidrelétricas (63,8% da capacidade total de geração – e no mundo, 16,4%), mas as usinas eólicas, que utilizam a força dos ventos, são as que têm apresentado maior crescimento: sua capacidade de geração passou de menos de 2% do total, em 2013, para 8,8%, em dezembro de 2018 e para 9,1%, em abril de 2019. O Brasil ocupou o quinto lugar no ranking de capacidade eólica nova instalada no mundo, em 2018, depois da China, Estados Unidos, Alemanha e India. Mais de 80% das usinas de produção de energia eólica estão localizadas em estados do Nordeste. Em energia solar, a expansão foi lenta até 2016, mas acelerou-se em 2017/2019, tanto na Geração Distribuída (GD), isto é, a produção de energia pelo próprio consumidor, em painéis solares instalados em telhados de prédios residenciais, industriais ou comerciais, quanto nas usinas solares centralizadas de maior porte. A Geração Distribuída aumentou de 7,4 mil locais com instalações, em dezembro de 2016, para 71,4 mil, em abril de 2019, indicando crescimento acumulado de 865% em pouco mais de dois anos.
Por outro lado, dados recentes do Ministério de Minas e Energia mostram que, como resultado da menor elevação da capacidade instalada das usinas térmicas que utilizam como combustíveis o carvão e os derivados de petróleo, sua participação relativa na geração elétrica do país reduziu-se de 19,8%, em dezembro de 2013, para 15,5%, em abril de 2019. As usinas térmicas que utilizam matérias primas renováveis (biomassas) diminuíram levemente sua participação relativa na capacidade instalada de geração, de 9,1% para 8,9 %, apesar do aumento no número de usinas em operação no mesmo período.
Ao lado da constante redução nos custos de geração de energia das fontes renováveis e do aumento da conscientização dos empresários e dos consumidores sobre a necessidade de se ampliar o uso de energias limpas, o Brasil adotou, ao longo dos anos, um conjunto de ações em políticas públicas que incentivam os investimentos em energias renováveis e em biocombustíveis. A política mais duradoura é a obrigatoriedade da mistura de etanol à gasolina, adotada em 1975, no Proálcool, cuja proporção atual é de 27%. Nessa mesma linha, o Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB) contribui para a redução da poluição emitida pelos veículos a diesel ao aproveitar diferentes fontes de plantas oleaginosas para a produção do biodiesel e sua mistura ao diesel fóssil. O Brasil é o segundo mercado mundial no consumo do biodiesel, depois dos Estados Unidos. A mistura obrigatória atual de 10% será aumentada em 1% a cada ano, até atingir 15%, em 2023.
Outros mecanismos essenciais são os programas de financiamento do BNDES para parques eólicos e energia solar, e os leilões de contratação de energia da Agência Nacional de Energia Elétrica – Aneel, que estimulam os investimentos em fontes de energia limpas, proporcionam maior diversificação na oferta de energia e ampliam as oportunidades de emprego mais qualificados. Dados do BNDES mostram que o valor dos financiamentos para a implantação de parques de geração eólica somou R$ 40,4 bilhões nos últimos quatorze anos, em valores nominais. Desse valor, 85% foram concedidos para a implantação de usinas eólicas em sete estados do Nordeste, e 12,3% no Rio Grande do Sul.
Não obstante os avanços comentados, persiste ainda no Brasil a aplicação de tarifas altas nas contas de energia, que se elevaram, de 2014 a 2018, em valores reais, em 12,8% para o setor residencial, 19,1% para comércio e serviços e 25,7% para o setor industrial. As causas são conhecidas: i) correções nas tarifas das empresas concessionárias de energia, resultantes das rebaixas tarifárias aplicadas pelo governo federal, em 2013, consideradas insuficientes para cobrir os custos de geração elétrica; ii) necessidade de acionamento das usinas térmicas, de custos mais elevados, para suprir a diminuição temporária de energia das usinas hidroelétricas nos meses com menores índices de chuva; iii) os subsídios pagos pelos consumidores a diversos tipos de usuários dos serviços de energia; iv) os diversos encargos e tributos incidentes sobre as contas de luz.
A alta presença das fontes renováveis na geração de eletricidade, com base nos aproveitamentos dos mananciais dos rios brasileiros, tornou o Brasil referência mundial em energias limpas, com baixa emissão relativa de gases poluentes na atmosfera. Essa vocação vem sendo reforçada pelo interesse crescente pelas fontes eólica e solar. Apesar de persistirem ainda no país algumas vozes contrárias à tese do aquecimento global, as políticas já adotadas permitem supor que o país continuará na trajetória de aumento das fontes de energia limpa, com aproveitamento crescente das potencialidades regionais, contribuindo para minimizar as mudanças climáticas e seus impactos no meio ambiente e para o aumento da renda e do emprego.
Fonte: Valor Econômico