Com boa parte das cidades ao norte — a capital inclusive — sob alerta máximo de poluição, a China começa 2017 com o dilema de como continuar crescendo a passos largos sem criar as imensas nuvens carregadas de partículas tóxicas que cobrem o céu de parte do país desde o primeiro dia do ano. Especialistas afirmam que a poluição impõe à China um custo anual elevado, de 3% a 3,5% do Produto Interno Bruto (PIB), ou até mais, a depender de quem faz a conta. Um montante entre US$ 330 bilhões e US$ 385 bilhões, se considerados os dados da economia em 2015, o equivalente a cerca de US$ 1 bilhão por dia.
O Centro Meteorológico Nacional da China acionou, pela segunda vez em menos de um mês, os alertas vermelho e laranja para a poluição. Mais de 1.500 fábricas nas imediações da capital foram obrigadas a diminuir a produção, ou simplesmente parar, para conter as emissões, inclusive uma refinaria da estatal Sinopec. Autoestradas na entrada da cidade, uma das regiões mais industrializada do país, também foram fechadas. Obras foram suspensas e, em apenas um dia, centenas de voos cancelados em Tianjin, a meia hora de trem-bala de Pequim. Milhares de carros foram impedidos de circular na ruas, e as escolas suspenderam as aulas. A poluição já é a causa de um terço das mortes na China, segundo estudo da Universidade de Nanquim.
O grande problema é que a China ainda é uma economia movida a carvão — a metade do carvão produzido no mundo. E é um carvão de má qualidade, que precisa ser queimado em maiores quantidades. A meta do 13º Plano Quinquenal da China é que participação do carvão caia a 58% da matriz energética até 2020. Atualmente está em 67%.
— Mas a China continua dependendo do carvão para quase 75% de toda a geração de energia e, por isso, precisa ter poluição para alimentar o crescimento. Ao mesmo tempo, não se trata de um dilema. As pessoas estão muito mais dispostas a sofrer com a poluição do que com o desemprego e uma economia em queda. Um problema é tolerável, o outro, não — disse ao GLOBO Christopher Balding, professor de economia da Escola de Negócios de Shenzhen, da Universidade de Pequim.
Os esforços recentes do governo para reduzir a capacidade de produção de carvão, segundo analistas, acabaram por elevar os preços e estimular os produtores, com o efeito colateral de aumentar os riscos de acidentes nas minas. Centenas de minas de pequeno porte foram fechadas desde 2012.
De acordo com a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), a poluição atmosférica deve reduzir o PIB global em 1% até 2060. No caso da China, seriam 2,5%, em função de licenças médicas de trabalhadores, gastos com saúde e perda de produtividade na agricultura. O estudo também prevê que o número de mortes prematuras triplique entre 2010 e 2060. Relatório divulgado em 2013 pela Academia de Planejamento do Meio Ambiente, do Ministério da Proteção ao Ambiente, estimou que o custo seria de 2,5% do PIB em 2010. O percentual sobe para 3,5% do PIB ,se incluídos os danos ao ecossistema. Já o Banco Mundial (Bird) calcula as perdas em 3% do PIB ao ano.
INVESTIMENTO EM SOLAR E EÓLICA
Ainda assim, a China lidera os investimentos em energia solar e eólica do mundo. Bateu recorde de produção no ano passado, instalando 16,5 gigawatts (GW) e 30,5GW em apenas 12 meses. O presidente Xi Jinping, no seu discurso durante uma reunião de cúpula, afirmou que a poluição é uma das seis prioridades da economia.
Para Anne Stevenson-Yang, cofundadora da J Capital Research, consultoria baseada na capital chinesa, o país não tem ferramentas políticas para resolver a questão ambiental.
— O meio ambiente vai melhorar porque a produção de cimento e aço vai cair, e isso pode acontecer ainda este ano. Antes disso, não acho que haja escolhas de políticas a serem adotadas — afirmou Anne.
Quando quer limpar o céu, a China recorre a decisões de governo. Em setembro do ano passado, para garantir dias despoluídos aos chefes de Estado e de governo durante a cúpula do G-20 (grupo que reúne as 20 principais economias do mundo), centenas de fábricas em um raio de 300 quilômetros da cidade de Hangzhou, sede do evento, foram desligadas. O fechamento temporário, total ou parcial, de fábricas por até dez dias afetou fornecedores e clientes, dentro e fora do país, segundo a agência Icis. O “financiamento verde” é um tema recorrente na China e foi levado ao G-20. Mas ainda há muito a ser feito.
Fonte: O Globo (goo.gl/Em19lS)