A Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler (Fepam) pode ser resumida com uma instituição que vive sob o fogo cruzado. De um lado, os ambientalistas cobrando mais rigor na concessão de licenças, do outro, os empresários exigindo rapidez. O desafio de prestar um serviço que possa atender a importantes interesses da sociedade é grande para uma entidade que não tem recursos volumosos (a proposta orçamentária para 2015 é de cerca de R$ 74,4 milhões) e possui poucos empregados (361, incluindo os emergenciais). O presidente da Fepam, Nilvo Luiz Alves da Silva, sustenta que, para a organização dar conta das demandas apresentadas, a solução será melhorar a gestão da fundação.
Jornal do Comércio – Chegando ao final do governo Tarso Genro, qual o seu destaque no período em que o senhor dirigiu a Fepam e o que gostaria de ter tido mais tempo?
Nilvo Luiz Alves da Silva – Tudo que não tive aqui foi tempo. Eu acho que ninguém pegou a Fepam como eu peguei. Comigo não teve transição. Entrei depois da Concutare (operação da Polícia Federal concluída no ano passado que revelou diversas irregularidades em órgãos ambientais). A Fepam também vinha de uma paralisação, pois o prédio da fundação incendiou e ficamos dois meses com o licenciamento parado no Estado. Passamos esse um ano e meio resolvendo boa parte de passivos judiciais, resolvendo vários licenciamentos que foram apontados na operação Concutare. Mas começamos a mudar as bases de gestão da fundação, que foi de fato a diferença do trabalho.
JC – O que foi feito para melhorar a gestão da Fepam?
Silva – Trabalhamos em um plano de cargos e salários, que mudou a matriz salarial dos funcionários, mas não só isso. Criou-se adicionais de capacitação, para especialização dos técnicos e mudamos o quadro de CCs (cargos em comissão) da fundação. Pelo novo plano, todas as funções de chefia das áreas técnicas só podem ser exercidas por funcionários concursados. O único chefe hoje que não é do quadro sou eu. Esse é um enorme impacto agora, na hora da transição, que dá muita tranquilidade. O pessoal vai ficar, porque é do quadro. As pessoas que estão trabalhando, que estão implementando coisas, continuarão dentro da casa. Então, se o governo resolver trocar todas as chefias, será uma substituição de funcionários do quadro por funcionários do quadro.
JC – Falta pessoal para a Fepam?
Silva – Podem ficar dizendo que a Fepam precisa de mais gente. Porém, se a Fepam não se organizar melhor, pode contratar mais mil pessoas, mas vai piorar, com todo mundo batendo cabeça. Tem que passar por essa melhoria de gestão e estrutura. Seria uma pena, baseado em uma ideia vaga de que a Fepam é um problema, não dar continuidade ao esforço de melhorar a gestão. A fundação está no ponto de dar respostas melhores. Com poucos ajustes e alguma continuidade de investimento, a Fepam conseguirá melhorar bastante.
JC – Como está o desenvolvimento do concurso para renovar o quadro?
Silva – Na sede (Capital), estamos repondo pessoal. O reforço da Fepam será nas regionais, que são oito (Tramandaí, Santa Cruz do Sul, Santa Maria, Alegrete, Pelotas, Caxias do Sul, Santa Rosa e Passo Fundo). Vamos interiorizar. Não tem sentido mandar um técnico de Porto Alegre a Santa Rosa fazer uma vistoria. O concurso será realizado em março. Serão 60 pessoas para a Capital (reposição) e 40 no Interior (acréscimos). Com esse concurso, a prioridade é melhorar a qualidade e não a quantidade.
JC – É possível dizer que a pasta foi desburocratizada?
Silva – O que a Fepam está fazendo é se organizar melhor, mas há coisas que não tem o que fazer, que são da lei. A fundação está tentando se tornar mais transparente e dar mais orientação aos empreendedores. O grande tema da Fepam é a gestão.
JC – Qual a sua avaliação quanto à agilidade da Fepam?
Silva – O pessoal cobra muito a agilidade, mas acho que a gestão ambiental é muito mais critério. Cobrar e estabelecer o nível de controle adequado para o risco daquela atividade. Porque, se errar, por exemplo, com uma central de processamento de resíduos perigosos, o resultado é desastroso. Mas, com uma metalúrgica que nem trabalha com óleo, a consequência é pequena.
JC – Qual a quantidade de emissões de licenças pela fundação?
Silva – Em 2013, foram 10.913 licenças emitidas (e, antes do fim de novembro deste ano, já tinham sido emitidos mais de 10,7 mil licenciamentos). Até hoje, a demanda era um pouco maior do que a capacidade da Fepam. Então, a cada ano,. acumulavam licenças do ano anterior. Este ano será o primeiro, desde 2010, que demanda e capacidade de emissão estão sendo equivalentes. Eu acredito que futuramente a Fepam tem perfeita capacidade de recuperar os passivos (licenciamentos atrasados).
JC – O que pode otimizar esse processo de licenciamento?
Silva – A maior demanda da Fepam, 70% a 80%, é quanto a renovações de licenças que já existem. É aí que está o nó, porque a Fepam não estabeleceu um procedimento mais simplificado. É quase um novo licenciamento e não precisa disso. Também muitos desconhecem que a renovação de licenças ambientais deve ser requerida com antecedência mínima de 120 dias da expiração de seu prazo de validade. Com isso, a licença fica automaticamente prorrogada até a manifestação definitiva do órgão ambiental competente.
JC – Há alguma ferramenta tecnológica que possa aprimorar a operação?
Silva – Existe um processo, financiado pelo Banco Mundial (US$ 9 milhões), que fará com que todo o trabalho da Fepam seja digitalizado. Os processos em papel não existirão mais. Isso levará três a quatro anos e dará mais transparência, mais agilidade.
JC – A pressão do meio empresarial por maior rapidez no licenciamento faz parte do ofício?
Silva – Faz parte do ofício. Eu até me surpreendo com a Fepam conseguindo fazer tudo o que faz, com os recursos que tem. Mas acho que pode fazer mais. Na essência, um órgão de meio ambiente tem que ser avaliado pela qualidade do ar e da água do rio. Não tem outro parâmetro no final das contas. Mas pelo que a Fepam e os órgão ambientais do Brasil inteiro são cobrados hoje? Emissão de licenças. O pessoal não está preocupado se a licença é boa ou não, e sim com quantas licenças são emitidas. Isso é um equívoco, pois gera situações como a Concutare. É perfeitamente possível um órgão ambiental ser ágil, transparente e que proteja o meio ambiente. A gente perdeu a perspectiva e é um tema estratégico. Olha São Paulo. O tema ambiental é estratégico para a própria economia.
JC – Qual o segmento mais complexo para licenciar?
Silva – Mineração. Principalmente para o setor de material de construção com materiais como argila e areia, porque é pulverizado, com várias pequenas empresas que não têm os recursos das grandes indústrias.
JC – Os problemas com a extração de areia no rio Jacuí foram equacionados?
Silva – Mais ou menos equacionados. Do ponto de vista da fiscalização, aumentou. Criamos uma fiscalização integrada com a Polícia Civil e a Brigada Militar. Também elevamos as distâncias das margens e reduzimos a profundidade (para a exploração), mas ainda estamos tentando licitar os estudos do zoneamento (para a extração de areia na região). A estimativa é que leve três anos para concluir o trabalho, porém estamos com dificuldade de fazer a licitação. O recurso existe, contudo não é um estudo que as consultorias fazem normalmente.
Fonte: Jornal do Comércio (http://goo.gl/a3Oo0Q)