O setor do agronegócio venceu a disputa travada com ambientalistas no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a validade de 22 pontos do Código Florestal (Lei nº 12.651, de 2012). Os mais relevantes – entre eles o que concede anistia por desmatamentos realizados antes de julho de 2008 – foram mantidos pelos ministros.
Considerado favorável aos interesses do segmento agropecuário desde que foi aprovado pelo Congresso Nacional, o texto foi discutido nas últimas três sessões do Supremo, por meio de quatro ações diretas de inconstitucionalidade (Adins 4901, 4902, 4903 e 4937) e uma ação declaratória de constitucionalidade (ADC 42).
A relevância da anistia de sanções administrativas e criminais por desmatamentos concedida a produtores que aderiram ao Programa de Regularização Ambiental (artigos 59 e 60) foi destacada nos votos dos ministros Dias Toffoli e Celso de Mello. O decano foi o responsável por desempatar esse ponto das discussões, mantendo o benefício.
Os ministros só afastaram a possibilidade de os crimes ambientais anteriores a julho de 2008 prescreverem durante o período de regularização previsto no programa. Na prática, o produtor que não seguir as regras poderá ser responsabilizado posteriormente.
Na sessão de ontem, o ministro Celso de Mello fez a leitura de seu voto em que detalhou mais princípios fundamentais e a importância da defesa do meio ambiente do que os pontos do código. Para ele, questões que envolvam e comprometam o meio ambiente não podem se subordinar a interesses corporativos ou econômicos.
O ministro chegou a citar o voto do ministro Ricardo Lewandowski, o mais favorável aos ambientalistas, quanto ao “in dubio pro natura” – numa alusão ao “in dubio pro reo”, que decide favoravelmente ao réu quando há dúvidas em ações penais – e falou em “in dubio pro seguridade”. Apesar disso, acompanhou os votos do relator, ministro Luiz Fux, “de forma mais abrangente” e do ministro Dias Toffoli, em pontos específicos, como o da anistia.
Entre os pontos alterados pela decisão do Supremo, o mais importante é o que trata da cota de reserva ambiental, prevista no artigo 48, parágrafo 2º. Os ministros decidiram que a área onde será feita a compensação ambiental deverá ter a mesma identidade ecológica – o mesmo tipo de vegetação.
O entendimento, porém, segundo o advogado Rodrigo Justus, consultor técnico sênior da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) – parte interessada no processo -, estaria em conflito com o artigo 66 do código, que tem determinação mais abrangente, para compensação dentro do mesmo bioma (onde há vários tipos de vegetação), e foi mantido pelo Supremo.
Com o julgamento, um setor, especificamente, pode ser afetado, que é o de gestão de resíduos. Os ministros definiram que esse tipo de atividade não pode ser feita em Área de Preservação Permanente (APP), o que pode ter efeitos para quem lida com tratamento de água e esgoto e está ao lado de cursos d’agua, por exemplo.
A avaliação dentro do segmento agropecuário é que a decisão do STF trará mais segurança jurídica ao campo e pode destravar investimentos que estavam paralisados em função do impasse judicial.
De acordo com o advogado Rudy Ferraz, consultor jurídico do Instituto Pensar Agro, entidade ligada à Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) – mais conhecida como bancada ruralista do Congresso -, os dispositivos da lei considerados inconstitucionais pelo STF representam pouco impacto ao setor produtivo. “O código agora deixa de ser uma dúvida para o produtor rural.”
Para os ambientalistas, a decisão foi uma decepção. “Os pontos declarados inconstitucionais são importantes, mas não são os mais relevantes”, afirmou Nurit Bensusan, assessora do Programa de Políticas e Direitos Socioambientais do Instituto Socioambeintal (Isa). “Pensamos que o novo Código Florestal protege menos que o anterior. Tínhamos a expectativa de que o Supremo corrigiria alguns pontos.”
A questão da anistia é considerada grave e pode gerar a expectativa de novos perdões para desmatamentos, além de premiar os infratores em relação a quem seguiu o código no passado, segundo Nurit.
De acordo com Letícia Yume, consultora em direito ambiental do escritório Peixoto & Cury Advogados, a decisão traz segurança jurídica. “A lei já está em vigor há quase seis anos e muitos dispositivos, como a instituição de reserva legal por meio de compensação ambiental, não estavam sendo aplicados pelos órgãos ambientais por conta de possível revereversibilidade da lei”, afirmou. (Colaborou Cristiano Zaia, de Brasília)
Fonte: Valor Econômico (goo.gl/3aNi3z)